sexta-feira, 23 de agosto de 2019

O TÊNIS PODE INFLUENCIAR NA ECONOMIA DE CORRIDA? PODE AJUDAR A MELHORAR A PERFORMANCE?

Todos nós que corremos temos uma certa veneração pelo calçado que utilizamos acreditando que ele possa fazer muita diferença em termos de performance e proteção. Mais recentemente, uma nova linha de pensamento sobre o uso ou não de calçado vem tomando corpo, afirmando que nosso pé é capaz de amortecer o impacto da corrida. Esta "filosofia" de comportamento defende este formato, pois tendemos a modificar o tipo de pisada para antepé. Ainda afirma-se que nesta condição podemos ter maior performance já que a massa do calçado ou sua ausência proporciona uma maior economia de corrida (ENTENDENDO O CONCEITO DE ECONOMIA DE CORRIDA). 

Através da compilação de diferentes estudos (meta-análise), feita por Cheung e colaboradores (2016) verificou-se  os efeitos de tipos de calçado e a sua não utilização, no consumo de oxigênio. Um total de 13 estudos foram escolhidos, de acordo com alguns critérios, à partir de uma busca de 2328 trabalhos publicados. Este trabalho, comparando o uso de um tênis tradicional e a corrida descalça, verificou uma maior economia de corrida para a condição descalça, comparação feita em 7 dos 13 trabalhos considerados. Isto também aconteceu, favoravelmente aos tênis minimalistas, e 6  dos 13 trabalhos que comparam os tênis minimalistas e os tradicionais.  E na última comparação, descalços e minimalistas,  a maior economia de corrida foi favorável aos minimalistas, em 4 dos 13 trabalhos. 




Mas em condição de fadiga, como fica esta possibilidade de melhorar a performance? O tipo de tênis faz diferença? Blair (2019) demonstrou que o quando os corredores avaliados utilizaram o calçado minimalista obtiveram uma média de 6 a 7 segundos mais rápidos em tiros de 1000 metros, em um protocolo de fadiga utilizado no estudo. 




E as novas tecnologias na construção de calçados? Como elas se comportam em termo de economia de corrida? Existe uma busca constante por tênis leves, com amortecimento, confortáveis e com uma certa rigidez longitudinal, variáveis que podem afetar a economia de corrida. Para se ter uma idéia, considerando somente a massa do calçado, para cada 100g do tênis há o aumento em 1% no consumo de energia (Frederick, 1984). 

Outro fator que as marcas vem buscando é a possibilidade de que o material utilizado em sua construção possa proporcionar  até mesmo uma propulsão além da realizada pela força muscular. Mais recentemente, uma importante marca está veiculando a informação de que o mais novo modelo de tênis chega a proporcionar uma economia de energia de até 4%. Buscando trabalhos que mostrassem isso de forma científica encontramos dois artigos: um demonstrando o protótipo da marca e o outro já analisando-o após o seu lançamento. 

Hoogkamer e colaboradores (2018), citando dois outros autores, comentaram sobre duas importantes propriedades dos calçados, principalmente relativo às entressolas, relacionando-as como complacentes, e normalmente macias. Outro conceito apresentado por eles é o de resiliência, definido como percentual da energia estocada que pode retornar como movimento. Com estes dois conceitos, comentaram sobre o aumento do custo energético quando o tênis ou piso apresentam complacência mas com baixa resiliência. O ideal seria apresentar uma alta resiliência, ou seja, um grande retorno de energia. 


Fig 2 - Composição da entressola do protótipo estudo no artigo de Hoogkamer e colaboradores (2018)
Com este preceito foi desenvolvido um protótipo de tênis de corrida que combina uma entressola complacente e resiliente através de uma placa rígida de fibra de carbono (fig. 2 - plate) em sua composição. Hoogkamer e colaboradores (2018) demonstraram uma redução no consumo de oxigênio da ordem de 4%, com o uso de um calçado protótipo,  em três velocidades diferentes em corridas de 5 minutos, comparado a dois outros modelos de calçados tradicionais, mesmo gerando uma potencia relativa bem semelhante. Os individuos que participaram eram atletas (SUB 31' nos 10 km). Este calçado apresentou uma complacência duas vezes maior e uma resilência cerca de 8 e 30% maior que os outros dois modelos, um da própria marca e outro de uma concorrente, respectivamente, ambos direcionados para maratona. 


Fig. 3 - Comparação do custo energético de três tipos de calçados protótipo com placa de fibra de carbono na entressola (NP), tênis direcionado para maratona da mesma marca do protótipo (NS) e tênis da concorrente para maratona (AB) 

Fig.4 -  Modelos de tênis comparados no estudo de Hoogkamer et al. (2018) - NP - Protótipo. 

Parece que o futuro para os tênis de corrida pode ter um salto de evolução nos próximos anos, onde o objetivo primário de absorção pode não ser mais a maior busca das empresas, mas sim a possibilidade que seu desenvolvimento ajude a melhora da performance. Isso não poderia ser um doping tecnológico como foram as roupas de natação na década passada? O que vcs acham? 

Somente para apimentar a discussão sobre este artigo que apresenta o protótipo, três de seus autores tem ligação com a fabricante, dois como funcionários e um como consultor. 

No próximo post mostraremos o outro trabalho científico à respeito deste calçado, estudando-o não mais como protótipo, mas sim como um calçado comercialmente presente. 



Referências Bibliográficas: 

Blair, J. F. (2018). The effect of minimalist footwear on running economy following exercise-induced fatigue (Doctoral dissertation, Memorial University of Newfoundland). 

Cheung, R. T., & Ngai, S. P. (2016). Effects of footwear on running economy in distance runners: A meta-analytical review. Journal of science and medicine in sport19(3), 260-266.

Frederick, E. C. (1984). Physiological and ergonomics factors in running shoe design. Applied ergonomics15(4), 281-287.

Hoogkamer, W., Kipp, S., Frank, J. H., Farina, E. M., Luo, G., & Kram, R. (2018). A comparison of the energetic cost of running in marathon racing shoes. Sports Medicine, 48(4), 1009-1019.


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