sexta-feira, 26 de julho de 2019

TREINAMENTO EM LADEIRA É REALMENTE IMPORTANTE PARA A ECONOMIA DE CORRIDA E PERFORMANCE?


por Luis Felipe Milano Teixeira 




Nossas publicações veem dando atenção à aspectos que podem, ou não, desenvolver a ECONOMIA DE CORRIDA (EC). A publicação de 12/07/2019, (Como o HIIT pode contribuir com a Economia de Corrida - https://vastuscorrida.blogspot.com/2019/07/como-o-hiit-pode-contribuir-com.html) discutiu o papel do treinamento intervalado de alta intensidade (HIIT) no aprimoramento da EC, no entanto, um tipo específico de HIIT muito difundido entre corredores é o treinamento em ladeira, também denominado como treinamento em rampa e merece uma atenção especial. Desse modo, nessa postagem temos o objetivo de aprofundar a temática dos efeitos do HIIT na EC com ênfase para o treinamento em ladeira/rampa.

O treinamento em ladeira/rampa representa uma forma de treinamento intervalado frequentemente utilizada por treinadores, atletas e praticantes de corrida de rua. Uma rápida busca no Google sobre treinamento em ladeira/rampa nos retorna centenas de resultados, em sua maioria, destacando o papel essencial desse método de treinamento para desenvolvimento de força e, consequentemente, aprimoramento da EC e da performance em corrida de longa distância. Tal conclusão também é encontrada em alguns trabalhos de revisão, o que nos leva a acreditar que de fato se trata de uma metodologia indispensável (Sanders et al., 2004; Midgley et al., 2007).

Contudo, uma busca mais criteriosa, demostra que existem poucos estudos que investigaram o efeito desse tipo de treinamento e que a maioria dos registros sobre o treinamento em ladeira/rampa não estão baseados em dados oriundos de estudos científicos criteriosos, o que nos faz pensar se, de fato, se trata de uma metodologia indispensável (Barnes and Kilding, 2014). Daí a necessidade de uma investigação mais cuidadosa sobre o tema.

Ferley et al. (2013), investigaram os efeitos crônicos do treinamento em ladeira/rampa sobre o Consumo Máximo de Oxigênio (VO2Máx), velocidade associada ao VO2Máx (VMáx), velocidade associada ao limiar de lactato (VTL) e o tempo no qual a VMáx pode ser sustentada (TMáx) em corredores bem treinados (60,9+8,5 ml/kg/min). Para tal, Ferley e colaboradores (2013) dividiram 32 corredores bem treinados em três grupos. Um grupo recebeu o treinamento intervalado em ladeira/rampa (GHill; n=12); outro recebeu treinamento intervalado no terreno plano (GFlat; n=12); enquanto um terceiro, grupo controle, só realizou treinamento moderado de longa duração (GCon; n=8). O experimento teve duração de 6 semanas, onde os grupos com treinamento intervalado (GHill e GFlat) realizaram 12 sessões de treinamento intervalado e 12 sessões de treinamento continuo (4 treinos por semana, 2 HIIT e 2 contínuos) e o grupo controle manteve sua rotina normal de treinamento.

O treino em ladeira/rampa realizado pelo GHill foi composto por 10-14 séries de 30 segundos em esteira com inclinação de 10% na VMáx e intervalos entre as séries até que a Frequência Cardíaca (FC) atingisse 65% da FC máxima. Nos dias de treinamento continuo o grupo GHill realizou 45-60min à 75%VMáx em esteira com 1% de inclinação. O treino intervalado realizado pelo grupo GFlat foi composto por 4-6 séries com duração de 60%TMáx em esteira com inclinação de 1% e intervalos até que a FC atingisse 65% da FC máxima. Nos dias de treinamento continuo o grupo GFlat realizou 45-60min à 75%VMáx em esteira com 1% de inclinação. Finalmente, os participantes do GCon mantiveram suas rotinas habituais de treinamento. Um ponto importante desse estudo é que os autores se preocuparam em monitorar o volume das sessões de treinamento de todos os grupos e puderam observar que não houve diferença no volume de treinamento intervalado, de treinamento continuo e do volume total entre os grupos GHill e GFlat, enquanto o grupo controle apresentou volume de treinamento significativamente maior que os grupos experimentais (Tabela 1).

Tabela1. Comparação do volume de treinamento ao longo das 6 semanas de experimento (Ferley et al., 2013) 

Os resultados encontrados pelos autores (Tabela 2) demostraram que tanto o GHill quanto o GFlat apresentaram desenvolvimento no TMáx . Contudo, ao comparar os dois métodos, o treinamento intervalado em terreno plano realizado pelos integrantes do GFlat se mostrou mais eficiente que o GHill.

Tabela2. Resultados dos testes pré e pós as 6 semanas de intervenção (Ferley et al., 2013) 


O estudo apresentado demonstra a necessidade de mais investigações acerca dos efeitos do treinamento em ladeira/rampa em corredores de longa distância para que seus efeitos possam ser exaltados da forma como ocorre atualmente. Como dito no início do texto, treinadores, corredores e demais profissionais relacionados à corrida de longa distância ressaltam os benefícios do treinamento em subida e o colocam como essencial em um programa de treinamento apesar das poucas evidências científicas publicadas para dar suporte a eficácia fisiológica ou qualquer consenso quanto a manipulação das variáveis relacionadas a esse método (intensidade, volume, inclinação, intervalo, entre outras).

No modelo testado (séries de 30segundos com inclinação de 10% em VMáx)  o treinamento em ladeira/rampa demonstrou ser eficiente como método de treinamento por gerar adaptações interessantes nos processos metabólicos, sem contar que pode gerar tais adaptações com um investimento de tempo menor (volume de treino).

No entanto, vale destacar também que o princípio da especificidade representa um aspecto importante de qualquer programa de treinamento e que a corrida em ladeira/rampa talvez não represente de modo significativo as exigências dessa modalidade esportiva, o que talvez explique o fato do GFlat ter obtido melhores resultados que o GHiit em relação ao tempo mantido em velocidade associada ao VO2Máx. Desse modo, o treinamento em ladeira/rampa por si só pode não ser o método de treinamento mais benéfico se pretende ter um bom rendimento em um percurso de corrida predominante plano.

Desse modo, fica notório que há um grande “gap" na literatura a respeito da relação entre  sessões de treinamento intervalado em ladeira/rampa com EC ou qualquer outro aspecto relacionado à performance em corridas de longa duração. Há necessidade de mais estudos que investiguem outros modelos de treinamento em ladeira/rampa, com diferentes intensidades, inclinações, volume de série e treino entre outras variáveis que possam ser manipuladas para se ter segurança do que se pode atingir com esse método.

Contudo, vale ressaltar que, ao contrário de outros métodos de treinamento contra-resistência, onde uma transferência de aprendizado precisaria ocorrer para melhorar a EC, o treino em ladeira/rampa é específico em relação ao movimento e provavelmente impacta diretamente em um ou mais dos sistemas metabólicos, biomecânicos e neuromusculares que estão relacionados à EC e por isso deve ser considerado como parte de um programa de treinamento completo.

Para aqueles que se interessarem sobre o tema, sugerimos a leitura do artigo intitulado “Effects of Different Uphill Interval-Training Programs on Running Economy and Performance” de autoria de Kyle Barnes, Andreu Kilding e Michael McGuigan, publicado em 2013 (Vol. 8) no “International Journal of Sports Physiology and Performance”. Nesse artigo, que será abordado em breve em nosso blog, os pesquisadores investigaram diferentes modelos de treinamento intervalado em ladeira/rampa e seus resultados podem contribuir bastante para o aprofundamento dessa temática.

Referências

Barnes KR, Kilding A. Strategies to improve Running Economy. Sports Medicine. 2014.

Barnes KR, Hopkins WG, McGuigan MR, et al. Effects of different uphill interval-training programs on running economy and performance. Int J Sports Physiol Perform. 2013;8(6):639–47.

Ferley DD, Osborn RW, Vukovich MD. The effects of uphill vs. level-grade high-Intensity interval training on VO2max, VMax, vLT and TMax in well-trained distance runners. J Strength Cond Res. 2012;27(6):1549–59. 

Midgley AW, McNaughton LR, Jones AM. Training to enhance the physiological determinants of long-distance running per- formance: can valid recommendations be given to runners and coaches based on current scientific knowledge? Sports Med. 2007;37(10):857–80. 

Saunders PU, Pyne DB, Telford RD, et al. Factors affecting running economy in trained distance runners. Sports Med. 2004;34(7):465–85. 

quinta-feira, 18 de julho de 2019

CORRER COM ANTEPÉ ASSEGURA UMA BOA PERFORMANCE?

Aprofundando um pouco no que havíamos abordado anteriormente, no post sobre a economia de corrida (https://bit.ly/2XUnjgw)  e, posteriormente, sobre como cada tipo de pisada não influencia nesta variável (https://bit.ly/32vyvDN), apresentamos um interessante e atual levantamento sobre o tipo de pisada em maratonistas de elite, desmistificando a questão de que a melhor performance está relacionada ao tipo de pisada.

Mas antes gostaríamos de apresentar o grau de complexidade quanto a questão da melhora da performance na corrida de longa duração. Veja o quadro abaixo retirado de uma importante estudo de 20 anos atrás, mas com citações em quase 1000 trabalhos científicos por todo o mundo, até os dias atuais.

Fig 1- Esquema dos fatores determinantes da performance em corridas de endurance (Paavolainen et al, 1999)

Observando o quadro, de baixo para cima, percebemos que a performance na corrida de longa duração depende de 4 grandes variáveis, sendo elas relativas ao consumo máximo de oxigênio (VO2max), ao limiar anaeróbico (LT), à Economia de Corrida (Running Economy), e a uma variável determinada pelos autores como VMart (velocidade mantida por 20 segundos em um teste incremental, onde em cada estágio houve o aumento de 0,35 m/s, com 100 segundos de recuperação. V Mart era a velocidade obtida no ultimo estágio em que o atleta consegue correr os 20 segundos completos).

Seguindo a nossa linha de raciocínio desde o segundo post (https://bit.ly/2XUnjgw), e abordando especificamente à EC, percebemos que, Paavolaine e colaboradores (1999) descrevem esta variável como dependente da Potência aeróbia, assim como da capacidade neuromuscular (veja as setas que chegam à Running Economy, no quadro), onde uma parte da questão neuromuscular está relacionada com a mecânica da corrida, e hoje ainda abordaremos o tipo de pisada como uma menor fração da mecânica da corrida.





Dentro do que abordamos anteriormente, sobre a não influência da pisada na EC (https://bit.ly/32vyvDN), pode-se considerar que a decisão sobre a forma de correr está muito mais relacionada à velocidade com que a corrida é realizada, assim como ao histórico motor de cada corredor.

Com relação à velocidade, diversos autores já demonstraram que o seu aumento eleva o percentual de corredores que utilizam o tipo de pisada com medio e antepé, em provas de 15k a maratona, onde os atletas de elite apresentam um percentual maior de corredores com este tipo de pisada, e os corredores recreacionais apresentam percentuais extremamente baixos de utilização desta forma de correr. (Hasegawa et al 2007; Larson et al 2011;  Kasmer et al ,2013; Hatala et al , 2013) 

Com relação ao histórico motor de cada corredor, a prática da corrida durante a sua vida determinará a forma de correr, assim, um velocista dificilmente será um corredor de retropé mesmo na situação de uma corrida de longa duração. Lieberman e colaboradores (2010) demonstraram que 91% dos corredores quenianos avaliados, com um histórico de uso de calçados recente, ainda continuavam correndo com antepé e mediopé. Enquanto que ao calçarem um tênis este percentual caiu para 72%. Percebe-se com este dado o quanto um padrão motor é determinante na forma de se locomover através da corrida.



Mas voltando ao levantamento citado no primeiro parágrafo, Hanley e colaboradores (2019) classificaram a pisada de 71 corredores e 78 corredoras no Campeonato Mundial de Atletismo em 2017, cujas performances na maratona deste evento estão apresentadas abaixo: 


Tabela 1- Caracterização dos corredores(as) quanto à suas performances na maratona no Campeonato Mundial de Atletismo em 2017. ( All finishers - todos os corredores (as) que terminaram a prova - Top 50% - os 50% mais rápidos ; Bottom 50% - os 50% mais lentos; %of PB - percentual acima do melhor tempo para a prova).



Ao verificarmos os resultados de como estes excelentes corredores pisam percebemos que não é a maioria que utiliza a corrida com antepé para correr. Vejam os gráficos apresentados pelos autores. 

Figura 2 - Distribuição do tipo de pisada em corredoras Retropé (RFS), Médiopé (MFS) e Antepé (FFS). Percebam que existem algumas corredoras com assimetria, principalmente entre retropé e médiopé. Os números dos circulos mostram a quantidade de corredoras com cada tipo de pisada. 
Figura 3 - Distribuição do tipo de pisada em corredores Retropé (RFS), Médiopé (MFS) e Antepé (FFS). Percebam que existem alguns corredores com assimetria, principalmente entre retropé e médiopé. Os números dos circulos mostram a quantidade de corredores com cada tipo de pisada.  
 As filmagens para determinação da pisada foram feitas em 4 momentos (4 voltas) e isso permitiu visualizar a tendência de aumento de utilização do retropé de acordo com a evolução da prova, tanto para homens como para mulheres, ao visualizarmos o aumento do número no círculo do retropé (RFS). Nas mulheres de 51 para 57 corredoras e nos homens de 37 para 47 corredores. 

Com relação ao mediopé (MFS) percebe-se uma tendência à manutenção nas mulheres (21 a 19 corredoras) e uma tendência à diminuição nos homens  (30 para 21 corredores). Já para a corrida de antepé percebe-se a manutenção e até a diminuição de um pequeno número de corredores. Lembrando que todos eles são corredores com excelentes tempos na maratona, obviamente, comparados conosco, meros mortais no mundo da corrida. 

Uma observação interessante é o maior número de mulheres correndo com retropé comparados aos homens, e um maior número de corredores de mediopé comparados às corredoras. Novamente entra a questão da velocidade já abordada anteriormente. Com o aumento da velocidade existe uma tendência à modificação no tipo de pisada, e como os homens correm mais rápidos, natural a manifestação de mais corredores com medio e antepé comparados às atletas. 

O mais interessante deste estudo são os dados apresentados terem sido coletados no ambiente de competição, demonstrando uma validade ecológica importante, pois os atletas não foram expostos a uma situação de experimento, e sim de competição real, tendo que se qualificar para participar do Campeonato Mundial, ou seja, a amostra do experimento é de extrema qualidade para identificar os fatores propostos. 

Como conclusão, os autores sugerem que não existe um padrão ótimo de pisada pensando em termos de performance e, além disso, afirmam que os atletas não devem ser encorajados a modificar a sua pisada, mas sim, deixa-las se manifestar naturalmente, quando o objetivo for a performance. 



Referências: 

- Paavolainen, Leena, et al. "Explosive-strength training improves 5-km running time by improving running economy and muscle power." Journal of applied physiology  (1999): 1527-1533.

- Hasegawa, Hiroshi, Takeshi Yamauchi, and William J. Kraemer. "Foot strike patterns of runners at the 15-km point during an elite-level half marathon." Journal of Strength and Conditioning Research  (2007): 888.


- Larson, Peter, et al. "Foot strike patterns of recreational and sub-elite runners in a long-distance road race." Journal of sports sciences (2011): 1665-1673.


- Kasmer, Mark E., et al. "Foot-strike pattern and performance in a marathon." International journal of sports physiology and performance (2013): 286-292.


- Hatala, Kevin G., et al. "Variation in foot strike patterns during running among habitually barefoot populations." PloS one (2013): e52548.


- Lieberman, Daniel E., et al. "Foot strike patterns and collision forces in habitually barefoot versus shod runners." Nature (2010): 531.



- Hanley, Brian, et al. "Most marathon runners at the 2017 IAAF World Championships were rearfoot strikers, and most did not change footstrike pattern." Journal of biomechanics (2019).


sexta-feira, 12 de julho de 2019

COMO O HIIT PODE CONTRIBUIR COM A ECONOMIA DE CORRIDA?


Luis Felipe Milano Teixeira






Dando sequência a série de postagens que abordam estratégias para promover a Economia de Corrida (EC), após introduzir a temática (ENTENDENDO O CONCEITO DE ECONOMIA DE CORRIDA) e discutir aspectos técnicos da passada relacionados à EC (CORRER COM ANTEPÉ OU RETROPÉ NÃO INTERFERE NA ECONOMIA DE CORRIDA, MAS PODE DIMINUIR DORES RELATIVAS À SINDROME PATELOFEMORAL) é hora de discutir o papel da intensidade de treinamento sobre a EC. Especificamente, nessa publicação, discutiremos o papel das sessões de treinamento intervalado de alta intensidade (HIIT) sobre a EC.

Apesar de, atualmente, mais difundido e praticado por corredores, muitos praticantes e profissionais possuem diversas dúvidas em relação à elaboração (manipulação de suas variáveis), realização, controle e efeitos sobre aspectos biomecânicos e fisiológicos relevantes à prática de corrida de rua.

Diversos estudos tem investigado os efeitos da inserção de sessões de HIIT no treinamento de corredores de rua e de fundo. Contudo, especificamente em relação à EC, os resultados ainda são contraditórios.

Enquanto algumas investigações demostram que o HIIT entre 93-120% da Velocidade de Consumo Máximo de Oxigênio (vVO2Máx) são capazes de promover EC (Billat et al., 1999; Slawinski et al., 2001; Denadai et. al., 2006; Franch et al., 1998; Barnes et al., 2013), outros estudos, utilizando metodologia HIIT semelhantes, não demostram resultados positivos em relação à EC (Yoshida et al., 1990; Franch et al., 1998; Smith et al., 1999; Barnes et al., 2013). 

Para colaborar com a falta de convergência entre os resultados, Jones e Carter (2000) destacam que corredores normalmente são mais econômicos nas velocidades em que habitualmente treinam e existem diferenças importantes nos protocolos de treinamento entre estudos que investigam essa relação.

Contudo, quando o objeto de estudo não é, especificamente a EC, a inserção de sessões de HIIT no programa de treinamento de corredores tem demostrado interessantes resultados em relação ao VO2Máx, vVO2Máx, Velocidade de Limiar Anaeróbico, entre outros (Lake & Cavanagh, 1996; Silva et al., 2017). Tais aspectos fisiológicos serão abordados em futuras publicações.

Especificamente em relação à EC, Franch e colaboradores (1998), investigaram 2 tipos de treinamento intervalado de alta intensidade (LIT e SIT) e continuo de alta intensidade (DT) sobre a EC. Os pesquisadores investigaram 36 corredores recreacionais divididos em 3 grupos. Um dos grupos realizou treinamento continuo de alta intensidade (DT, ˜=94% vVO2Máx), outro realizou treinamento intervalado extensivo (LIT, ˜=106% vVO2Máx) e o último realizou treinamento intervalo intensivo (SIT, , ˜=132% vVO2Máx), todos com volume entre 20-30min/semana por 6 semanas. Os resultados demostram que houve aumento significativo no VO2Máx, e na vVO2Máx em todos os grupos analisados, sem ganhos adicionais para os grupos intervalados (LIT e SIT) em relação ao grupo continuo (DT). Já em relação à EC foi observado desenvolvimento apenas nos grupos DT e LIT. Tais resultados sugerem que HIIT com intensidade muito elevada ( ˜=132% vVO2Máx) não é a estratégia mais adequada para desenvolvimento da EC, seja por conta de uma alteração importante no padrão de passada, ou ainda, pela incapacidade de manter um volume mínimo de treinamento para que sejam notados efeitos sobre essa variável ( o volume de treino é outro aspecto importante no desenvolvimento da EC e será abordado em textos futuros).

Mais recentemente, Silva e colaboradores (2017) investigaram a influência de 4 semanas de HIIT na estratégia de pace para 5km em corredores amadores. Para tal, 16 corredores foram divididos em dois grupos, 8 fizeram parte do grupo controle e 8 compuseram o grupo HIIT. O grupo HIIT realizou sessões de treinamento intervalado de alta intensidade duas vezes por semana, nessas sessões de treinamento eram realizadas 5 séries de 265+67 seg  (aproximadamente 4,5min) na vVO2Máx  com intervalo ativo à 60% vVO2Máx e duração igual ao esforço entre as séries (1:1 - trabalho:repouso), enquanto o grupo controle manteve sua rotina habitual de treinamento, sem exercícios intervalados. Vale destacar que os pesquisadores controlaram o volume e a carga total de treinamento e não houve diferença entre ou grupos no período. 


Figura1.Percentage of changes of the physiological variables after the training period. Data are reported as means±SD. HIIT: high-intensity interval training group; CON: control group; VO2max: maximal oxygen uptake; PTS: peak treadmill speed; OBLA: running speed associated with onset of blood lactate accumulation; RE: running economy measured at 12 km/h. *Po0.05 (unpaired t-test) (Silva et al., 2017)


Como principais resultados, foi observado aumento significativo na EC, aproximadamente 5-7%, e na velocidade pico de corrida, no grupo que acrescentou as sessões de HIIT em sua rotina de treinamento. Apesar de observar-se desenvolvimento das demais variáveis avaliadas em ambos os grupos (VO2Máx, Velocidade de Limiar Anaeróbico, pace para 5km, percepção de esforço nos 5km, performance nos 5km), não houve diferença entre os grupos nesses parâmetros (Figura 1).  

Tendo esses achados como exemplos do que pode-se encontrar na literatura, sugere-se que ambos os métodos de treinamento (Continuo e HIIT) devem fazer parte de programas de treinamento para corredores. Contudo, há necessidade de compreender que a formatação do HIIT (intensidade, volume, relação trabalho:repouso, entre outras) pode interferir diretamente na resposta adaptativa dos atletas. Ao que tudo indica, se o objetivo for desenvolver EC, é necessário prescrever sessões de treinamento intervalado, com intensidade próxima de 100% vVO2Máx, volume de 1-4min/série e proporção trabalho:recuperação de 1:1 ou 1:2 e frequência semanal de 1-3 vezes por semana (à depender da fase de periodização, nível de treinamento do atleta e administração do princípio da sobrecarga).

Vale destacar que esse texto refere-se à relação entre sessões de treinamento que utilizam o método HIIT e EC. Assim sendo, outras formas de configuração do HIIT, com intensidades diferentes (e.g. acima da vVO2Máx,), volumes diferentes (e.g. menores que 1min) e outras proporções entre trabalho:repouso (e.g. 1:,5 ; 1:3 ; 1:4) não devem ser descartadas em um programa de treinamento para corredores, uma vez que podem ser interessantes para desenvolver outros aspectos e serão exploradas em publicações futuras.


Referências

Barnes KR, Hopkins WG, McGuigan MR, et al. Effects of different uphill interval-training programs on running economy and performance. Int J Sports Physiol Perform. 2013;8(6):639–47.

Billat VL, Flechet B, Petit B, et al. Interval training at VO2max: effects on aerobic performance and overtraining markers. Med Sci Sports Exerc. 1999;31(1):156–63.

Denadai BS, Ortiz MJ, Greco CC, et al. Interval training at 95 and 100 % of the velocity at VO2 max: effects on aerobic physiological indexes and running performance. Appl Physiol Nutr Metab. 2006;31(6):737–43.

Franch J, Madsen K, Djurhuus MS, et al. Improved running economy following intensified training correlates with reduced ventilatory demands. Med Sci Sports Exerc. 1998;30(8):1250–6.

Lake MJ, Cavanagh PR. Six weeks of training does not change running mechanics or improve running economy. Med Sci Sports Exerc. 1996;28(7):860–9.

Silva R, Damasceno M, Cruz R, Silva-Cavalcante MD, Lima-Silva AE, Bishop DJ, Bertuzzi R. Effects of a 4 week hight-intensity interval training on pacing during 5-km running trial. Brazilian Journal of Medical and Biological Research (2017) 50(12): e6335.

Slawinski J, Demarle A, Koralsztein JP, et al. Effect of supralactate threshold training on the relationship between mechanical stride descriptors and aerobic energy cost in trained runners. Arch Physiol Biochem. 2001;109(2):110–6.

Smith TP, McNaughton LR, Marshall KJ. Effects of 4-week training using Vmax/Tmax on VO2max and performance in athletes. Med Sci Sports Exerc. 1999;31(6):892–6.

Yoshida T, Udo M, Chida M, et al. Specificity of physiological adaptation to endurance training in distance runners and competitive walkers. Eur J Appl Physiol. 1990;61(3–4):197–201.



sexta-feira, 5 de julho de 2019

CORRER COM ANTEPÉ OU RETROPÉ NÃO INTERFERE NA ECONOMIA DE CORRIDA, MAS PODE DIMINUIR DORES RELATIVAS À SINDROME PATELOFEMORAL

Em 2013 fiz um post sobre correr com tênis minimalista e sua influência no tempo de uma prova (https://bit.ly/2IPTw4y) . Neste estudo os autores concluíram que o uso dos tênis minimalistas promovem uma maior economia de corrida (EC) comparado ao uso dos tênis tradicionais, mas correr com o retropé ou antepé não interfere nesta variável. 

Na semana passada introduzimos o conceito de EC demonstrando quantas variáveis pode influenciar na velocidade com a qual você gasta menos energia para correr. (Entendendo o Conceito de Economia de Corrida)

Fig.1 - Corrida com antepé (A) e corrida com retropé (B)

Hoje apresentamos à vocês um recente estudo cuja a proposta foi determinar os efeitos do retreinamento da corrida de retropé para antepé após 6 semanas de um período de intervenção. Foram analisadas variáveis relativas à EC na condição aguda e crônica, e também um mês após a intervenção feita com retreinamento de técnica de corrida. Além disso, também foi verificado o efeito deste retreinamento na dor referida em joelhos nos corredores com sindrome patelofemoral. 


Neste estudo, 16 participantes se submeteram a 8 sessões de retreinamento à frente do espelho durante um período de 2 semanas, onde 8 deles foram orientados e incentivados a correr com antepé. Os demais receberam orientação somente incentivando a manutenção da corrida que vinham fazendo, com retropé. Todos utilizaram o mesmo calçado tradicional. 

Os resultados obtidos pelos autores demonstram que a alteração da corrida de retropé para antepé não provocou alteração, de forma estatisticamente significativa, nas três variáveis mensuradas, de forma aguda (pre), crônica (post) e um mês após o retreinamento entre os grupos (Follow-up). 




























Fig 2.  Indivíduos que correram com retropé (control) e com antepé (Exp). Escala visual analógica (VAS Score).
Variáveis: Consumo de oxigênio  (VO2), Frequencia Cardíaca (HR) e coeficiente respiratório (RER)

Outro resultado obtido pelo estudo foi referente à dor sentida no joelho. Com a intervenção houve dimunuição da dor referida pelos corredores, através de uma escala visual analógica (VAS) onde na condição pré estava em 5,3 pontos, em uma escala de 0 a 10, e após o retreinamento para corrida com antepé,  caiu para 1 ponto. 

Fig 3.  Comportamento da dor pela Escala Visual Analógica (Vas Score) na condição pré retreinamento (Pre), na condição pós retreinamento (Post) e um mês após a intervenção (Follow-up) em indivíduos que correram com retropé (control) e com antepé (Exp).

Como conclusão, o estudo apresenta a semelhança em termos das variáveis relacionadas à EC após 2 semanas de retreinamento da forma de pisar, de retropé para antepé, assim como um mês após o retreinamento. Mas houve uma redução significativa da dor no joelho, suportando a ideia de que esta pode ser uma estratégia de administrar as dores no joelho de corredores com sindrome patelofemoral. 

Um efeito adverso verificado pelos autores após um mês do retreinamento  de corrida com antepé foi a queixa de dores no tornozelo, após correr, em 2 dos 8 corredores. Ambos efetuaram treinos com mais de 6,5 km com antepé. Isso demonstra a necessidade de uma transição mais sutil para a corrida com antepé. Abordaremos futuramente sobre esta transição. 


Roper, J. L., Doerfler, D., Kravitz, L., Dufek, J. S., & Mermier, C. (2017). Gait retraining from rearfoot strike to forefoot strike does not change running economy. International journal of sports medicine38(14), 1076-1082.