quarta-feira, 15 de abril de 2020

O TÊNIS PARA PRONAÇÃO FAZ O QUE ELE REALMENTE SE PROPÕEM A FAZER?

      Eis aí uma grande pergunta feita pelos corredores: Comprar um tênis que se diz para corredores pronadores entrega o que ele realmente promete? Mas antes de responder esta pergunta, outras, de caráter de esclarecimento precisam também ser feitaas, como por exemplo: Para que serve o tênis na corrida? Seria ele uma imposição do mercado para corrermos calçados? Ou realmente ele é necessário para a proteção do pé e de todo o nosso sistema locomotor? 

Figura 1 -  Quando o tênis é excessivamente macio não faz o seu papel de proteção, não conseguindo evitar uma pronação excessiva como a vista no pé esquerdo do tênis azul. 

      Certamente o surgimento do calçado em geral veio para a proteção de nossos pés em longas caminhadas feitas por nossos longínquos antepassados, passando para um artefato de ostentação e pouca funcionalidade em tempos mais recentes, e hoje tem uma grande funcionalidade, adaptando-se à diversas formas de locomoção em terrenos diferentes, e também aos formatos do segmento protegido por ele, os pés. 

    Como vinhamos falando nos artigos anteriores especificamente sobre a pronação (FALANDO SOBRE PRONAÇÃO e COMO A PRONAÇÃO PODE AFETAR DIRETAMENTE A SOBRECARGA NOS MEMBROS INFERIORES DURANTE A CORRIDA), vamos nos ater somente à questão do tênis na função de controle do movimento, mais especificamente na questão do controle da pronação, neste post. 

        Um tênis com controle de movimento tem em sua estrutura um reforço que pode vir por meio de um EVA mais rígido, ou uma placa mais resistente, ou qualquer estrutura que faça que a região medial do pé não ceda tanto durante o momento em que o pé recebe sobrecarga, após efetuar o toque no chão. 

Figura 2 - uma das formas de tentar controlar uma pronação indesejada é a colocação de material mais rígido que as demais partes da entressola, como a destacada em preto no figura (Malisoux e colaboradores, 2016)

         Mas para responder a pergunta do título citamos dois artigos com bom embasamento e alta qualidade. O primeiro deles é de Malisoux e colaboradores, de 2016, onde sua maior credibilidade está em ser um trabalho denominado duplo cego, ou seja, nem o voluntário, nem o pesquisador sabiam que tipo de tênis o sujeito estava utilizando durante as tentativas, com controle de movimento ou um tênis neutro. Este tipo de estudo trás uma credibilidade, pois elimina muitos vieses que podem ocorrer quando este processo de "cegamento" não ocorre. 

          Neste estudo, 372 corredores receberam calçados e foram acompanhados por 6 meses para identificar o que acontecia com seu organismo durante este período de treinamento, principalmente na questão dos índices de lesões.  O número de lesões total foi menor entre os participantes que receberam o tênis com controle de movimento, sendo que a maior "proteção" foi obervada nos corredores com o pé pronado, avaliado previamente pelo Foot Posture Index (FPI), uma das únicas formas estáticas de avaliação capazes de avaliar o pé, clinicamente, em 3 dimensões, e que já foi apresentado em postagem anterior (COMO A PRONAÇÃO PODE AFETAR DIRETAMENTE A SOBRECARGA NOS MEMBROS INFERIORES DURANTE A CORRIDA).  Os corredores com pés pronados que receberam o tênis neutro tiveram um maior risco de lesão comparados aos corredores com pé neutro. Os autores concluiram que, no geral, o risco foi menor em corredores que receberam os tênis com controle de movimento, e principalmente, os corredores com pés pronados estavam mais protegidos com este tipo de calçado. 



        Outro recente trabalho, com resultados importantes sobre o papel do tênis de controle de movimento da pronação é o de Weir e colaboradores (2019), cujo foco foi o papel destes mesmos dois tipos de tênis (pronação e neutro) na variabilidade de coordenação entre os segmentos estudados. Um trabalho tecnicamente mais complexo, do ponto de vista metodológico, principalmente na análise dos dados. Neste trabalho foi analisado o efeito do uso deste tipo de tênis na segunda metade de uma corrida de 44 minutos. Em duas visitas ao laboratório, eles compararam o uso dos dois tipo de tênis, quando utilizados após 21 minutos de uma corrida a uma velocidade auto selecionada (média de 11,77 km/h), onde neste momento, trocava-se o tênis. Foi realizada análise cinemática e cinética no início, antes da troca do tênis, após a troca do tênis e antes do término do tempo prescrito.

        À partir da corrida inicial, todas as análises de coordenação entre partes dos membros inferiores (MMII) apresentaram um aumento na variabilidade da coordenação. Na corrida de intervenção (após a troca do calçado) este mesmo índice foi maior no tênis neutro comparado ao tênis com mais estabilidade.  Os autores afirmam que esta condição pode ser resultado de o calçado que promove estabilidade ser um perturbador da técnica do corredor e a resposta do organismo ser a de tentar regular esta variação da coordenação. Outra razão levantada pelos autores, talvez seja o fato de tênis para estabilidade do pé gerar maior suporte reduzindo o stress aplicado aos tecidos através de corridas prolongadas. 

          Nestes dois trabalhos podemos ver o quanto um tênis pode ter uma capacidade protetiva dependendo de componentes relativos à anatomia do pé do corredor, assim como, do tipo de calçado, cumprindo assim o seu papel de proteção não somente no solado, ou de traumas, mas sim no controle de um movimento indesejado, como a pronação, qdo feita  a uma alta velocidade e grande amplitude. 
         

Referências Bibliográficas: 

Malisoux, L., Chambon, N., Delattre, N., Gueguen, N., Urhausen, A., & Theisen, D. (2016). Injury risk in runners using standard or motion control shoes: a randomised controlled trial with participant and assessor blinding. Br J Sports Med50(8), 481-487.

Weir, G., Wyatt, H., Van Emmerik, R., Trudeau, M. B., Willwacher, S., Brüggemann, G. P., & Hamill, J. (2019). Influence of neutral and stability athletic footwear on lower extremity coordination variability during a prolonged treadmill run in male rearfoot runners. European journal of sport science, 1-7.




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