sexta-feira, 3 de abril de 2020

INTENSIDADE DE TREINAMENTO NA CORRIDA DE LONGA DURAÇÃO | PARTE 2: Mas afinal, como controlo isso?

Luis Felipe Milano Teixeira
@teixeiraluisfelipe
Teixeira.luisfelipe@gmail.com

Na postagem INTENSIDADE DE TREINAMENTO NA CORRIDA DE LONGA DURAÇÃO | PARTE 1: Mas afinal, o que é isso?  iniciamos a discussão sobre outra importante variável do treinamento, a INTENSIDADE, e destacamos a necessidade de se controlar e monitorar a intensidade de treino por meio de variáveis relativas, afinal, a intensidade relativa é a forma que nos permite compreender, exatamente, o tipo de estímulo que foi ofertado ao organismo. Destacamos também que a intensidade relativa pode ser expressa em percentual da freqüência cardíaca máxima, percentual da frequência cardíaca de reserva, percentual da velocidade máxima, percentual da velocidade de limiar anaeróbico, percentual da velocidade aeróbica máxima, dentre outras maneiras e que,  apesar das dezenas de formas de expressar a intensidade relativa, em atividades de endurance, habitualmente, se utiliza o percentual de consumo máximo de oxigênio (%VO2Máx).

Essa forma de compreender a intensidade reativa (%VO2Máx) permite identificar precisamente em que zona de treinamento o atleta realizou determinada sessão, qual foi o tipo de estresse imposto às células e, por isso, permite identificar precisamente qual será a melhor relação estimulo-repouso, quais as estratégias de recuperação que deverão ser implementadas e quais respostas adaptavas serão observadas nas células, tecidos e sistemas, entre outros aspectos.

Na primeira parte das postagens dedicadas à INTENSIDADE, concluímos o texto perguntado se você sabe, precisamente, qual foi a intensidade em que você trabalhou no seu último treino? Qual foi a intensidade relativa em que trabalhou? E o que essa intensidade representa para seu organismo?

É chegada a hora então de discutirmos algumas ferramentas simples para que você possa responder às perguntas acima de maneira positiva e assertiva e, dessa forma, possa compreender, enfim, que tipo de estímulo esta oferecendo às suas células e assim parar de treinar no escuro, sem saber exatamente para onde esta indo.

Uma forma muito simples de identificar a intensidade relativa de trabalho e, atualmente, relativamente acessível à maior parte dos corredores, é a freqüência cardíaca (FC). A FC, desde há muitas décadas, tem sido apontada como um importante marcador de carga interna, com forte relação com a taxa de trabalho necessária para se manter determinada demanda energética, especialmente, em atividades com “stead-state” como os treinos contínuos (Robinson et al., 1991; Hopkins, 1991; Art et al., 1994).

Entretanto, a FC por si só trata-se de uma medida de carga interna absoluta e, para um entendimento mais preciso do tipo de sobrecarga que foi imposta, a conversão desse dado, da FC de um determinado treino, para um equivalente relativo, pode ser mais interessante, informativo e assertivo, uma vez que considerará as diferenças inter e intraindividuais que existem no modo como diferentes indivíduos respondem à diferentes sessões de treinamento (Borresen & Lambert, 2009). 

Nesse sentido Karvonen e Vuorimma (1988) sugerem o cálculo do percentual de frequência cardíaca de reserva (%FCRes) como uma maneira precisa de prescrever e quantificar o exercício, de modo a, por meio da FC média do treino, identificar a intensidade relativa dessa sessão de treinamento por meio da equação 1, onde a FCMed é a FC média do exercício, a FCRep é a FC de repouso do indivíduo e a FCMáxima é a FC máxima do indivíduo. 



Equação 1. Determinação da intensidade relativa de trabalho por meio da FC média da sessão de treino (Karvonen & Vuorimma, 1988).


%FCRes = [ (FCMed - FCRep) / (FCMáxima - FCRep)]x100

  
A FCMed (FCMédia do exercício) é, de fato, o valor médio que a FC se manteve ao longo de todo o treino, pode ser aferida por meio de frequencímetros (a maior parte deles possui essa função) ou mesmo aferida manualmente ao longo de todo o período do treino (com intervalos fixos entre 3-5min a cada aferição). A FC de repouso, para ser avaliada de forma confiável, deve ser calculada por meio da média da aferição da FC de 3 manhãs logo ao despertar, antes de qualquer atividade, deitado em decúbito dorsal (de barriga pra cima). Já a FCMáxima pode ser avaliada por meio de protocolos de teste máximo, que é o modo mais preciso e adequado, mas, na impossibilidade de realizar esse tipo de procedimento, pode ser predita por meio de equações matemáticas. Existem diversas formas/equações para estimar/predizer a FCMáxima e, não é objetivo dessa postagem, discutir cada uma delas, mas, sugerirmos aqui a equação proposta por Tanaka et al., (2001), onde a FCMáxima é predita pela seguinte equação 2.



Equação 2. Equação preditiva da FCMáxima de acordo com Tanaka et al. (2001).
FCMáx = 208 - (0,7 x Idade)



        Assim sendo, se você tiver acesso a FCMédia do seu treino  e  aplicar  na  equação  1 poderá identificar qual foi sua a  intensidade  relativa  de  sua  sessão  de  treinamento  e, a partir  de   então,  iniciar  o  processo  de  tomada  de  decisão  acerca  de  outros  aspectos inerentes ao treinamento (i.e. tempo de repouso, próximo estímulo, entre outros).
A literatura indica alguns valores de intensidade que nos oferecem uma referência para cada capacidade física que se pretende desenvolver, como é possível observar na tabela 1.


Tabela 1. Intensidade relativa (%VO2Máx); Tempo médio de estímulo e Tempo médio de pausa indicado para o desenvolvimento de diferentes capacidades físicas relevantes ao corredor de rua. 

Dessa forma, é possível identificar se a intensidade relativa de uma determinada sessão de treino esteve na intensidade adequada para determinado tipo de adaptação.

Vale ressaltar que essa é apenas uma forma de controlar a intensidade do treinamento e que, em muitas vezes, é necessário calcular parâmetros paralelos para um controle mais adequado do treino, como Velocidade, Pace, entre outros, mas, independente do parâmetro de carga absoluta que será utilizado como meio para controle e monitoramento das cargas de treino, a referência será sempre a intensidade relativa, nesse texto, avaliada por meio do cálculo do %FCRes (%VO2Máx) a partir da FCMédia da sessão de treino.

Agora que já discutimos do que se trata essa variável do treinamento e, ao menos uma forma, de como monitora-lá, em nossa terceira e última publicação sobre intensidade de treinamento falaremos de como distribuir a intensidade de treino de acordo com seus objetivos e como transpor o %VO2Máx para indicadores absolutos mais práticos de se controlar durante treinos de corrida de rua. 
 
Continue nos acompanhado e não corra no escuro! 

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Referências:

ACSM, Quantity and Quality of Exercise for Developing and Maintaining Cardiorespiratory, Musculoskeletal, and Neuromotor Fitness in Apparently Healthy Adults: Guidance for Prescribing Exercise, Medicine & science in sports & exercise, 2011. DOI: 10.1249/MSS.0b013e318213fefb

Anderson O. Runing Science. Human Kinetics, Champaign-IL, 2013.

Arts FJ, Kuipers H. The relation between power output, oxygen uptake and heart rate in male athletes. Int J Sports Med 1994; 15 (5): 228-31
Brossen J, Lambert MI. The Quantification of Training Load, the Training Response and the Effect on Performance. Sports Med 2009; 39 (9): 779-795 

Hopkins WG. Quantification of training in competitive sports: methods and applications. Sports Med 1991; 12 (3): 161-83 

Impellizzeri FM, Marcora SM, Coutts, AJ. Internal and External Training Load: 15 Years On. International Journal of Sports Physiology and Performance, 2018.
Robinson DM, Robinson SM, Hume PA, et al. Training intensity of elite male distance runners. Med Sci Sports Exerc 1991; 23 (9): 1078-82
Tanaka H, Monahan KD, Seals DR. Age – Predicted Maximal Heart Revisited. J Am Coll Cardiol. 2001; 37:153-6.   

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